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sexta-feira, 8 de abril de 2016

Moléstia, guerras e Matt tornou-se lider...


E lá estava, em pleno 2016, a caixa de Pandora, cujos males da humanidade se encontravam guardados e protegidos. Guerras, moléstias e discórdias eram, de fatos, os presságios mais temidos, embora, entre tamanha desgraça, houvesse também o surf quebrado, a base aberta e a insânia dos juízes que, do alto de sua bancada, arbitravam sobre quem deveria ou não passar uma bateria… A caixa abriu-se e, com isso, Wilko vestiu-se de amarelo… Sinal dos tempos… sinal dos tempos…

O início…

O ano de 2016 abriu-se, como de costume, com a perna australiana… Três etapas, três bancadas que exigem técnica e borda cravada na água… No mundo do surf, cada país tem uma tradição a zelar, arduamente construída por anos de trabalho intenso de quem se dedica a passar horas imerso na água salgada; lapidada por desenhos geográficos de bancadas que impõem ao surfista uma modelagem para que delas se faça proveito… Quase escuto surgir das profundezas das pedras de Bells um gigante levantar-se e, com voz de trovão, bradar: Arcos, mortais, arcos alongados e profundos…. Somente respeitarei aqueles cujo surf lembrem Mike Peterson, o Grande… Toda vez que, do penhasco, avistamos alguém remar para uma onda, torcemos para que a linha seja desenhada com tranquilidade… Não deve haver ansiedade naquela bancada… Há centenas de anos, as ondas sempre encontram Bells do mesmo modo… E, a despeito de juízes, critérios e outras bobagens, Guigui, Jordy, Caio e Mick foram, para mim, quem entenderam o brado gutural do destemido gigante… Surfaram fácil como se andassem no parque…
O descompasso

A Australia não forja, prioritariamente, um modo de enfrentar as longas direitas que se disseminam no seu litoral… A Australia desenha, isto sim, um estilo, um modo de o corpo projetar-se sobre a prancha, justamente porque uma onda é igual a outra. As linhas da ondulação parecem feitas por jovens que, entre aulas, rabiscam no caderno uma bancada perfeita… Cada país, daqueles que se enquadram no cenário mundial, inscreve os seus numa sorte de grupo, unidos por afinidades eletivas… Ao cavucar o ranking é possível alinhavar os competidores dentro das tradições de cada uma das escolas… Surf de borda, progressivo, sobre a linha, power… 
É claro que, como na vida, nada é puro, imaculado… Há sempre quem transita por cima disso tudo, mas a genética é muito difícil de trair… Por isso, surpreende-me Matt ter chegado, na terceira etapa da perna australiana, reluzente em amarelo… O menos provável herdeiro da grande tradição do estilo aussie, assumiu-se líder do tour… O feito, improvável, deve-se a alguns fatores e, pasmem, nenhum deles parece ter sido elaborado pelo surf praticado pelo rapaz…

A vontade obtusa…

Confesso que o surf de Matt evoluiu, sobretudo, na maneira de atacar o lip. Ele está mais ousado e, sobretudo, mais concentrado… Corre a boca pequena que a razão da transformação é a nova personalização de Yoda em nosso planeta azul; isto é: Glen Hall… Imaginei nunca mais ouvir, em minha vida, o nome do falso irlandês associado ao tour, certo que ele sumiria nos arquivos do Data Surf… Mas, quando menos se espera, a voz sibilante do pequeno ressurge em meus ouvidos para confirmar que qualquer um pode chegar ao caneco… Para a maioria de  nós, imunes à dádiva do talento, o recurso que nos resta é a fé inabalável no trabalho duro… O problema, contudo, encontra-se na constatação de que, no surf como na vida, a força de vontade não é suficiente para sustentar o caminho da glória… Desculpem-me os amigos, cujas inclinações afetivas se sustentam pela ética protestante, mas não consigo, de fato, crer nisso.

Matt precisa comer muito feijão para ser Adriano

O que, outrora, fora razão de admiração com os feitos de Adriano em 2015, agora se transformou em moléstia… Qualquer um se vê no direito de se alçado à ponta do ranking… Basta repetir um certo ritual a cada bateria: respiração profunda, silêncio e uma espécie de concentração medida pela ausência de sorrisos e gestos amigáveis… Nós, humanos, adoramos enxergar no outro algo da nossa fraqueza ao mesmo tempo que essa mesma fraqueza se vê débil diante da força de vontade… 
Com o título de 2015, Adriano, de modo injusto, transformou-se, aos olhos de quem acompanha o tour, no campeão da perseverança. Esquecem-se, entretanto, que o camarada esteve anos entre os primeiros do ranking, que seu surf de borda é muito poderoso e que sua cavada, bem… a sua cavada é a mais impressionante do tour… Impor a Adriano a alcunha de esforçado é uma grande injustiça…
O mesmo não ocorre com Matt… Bom ataque de costas para onda… Entretanto, sejamos francos, alguma coisa não bate entre os resultados obtidos e o surf apresentado… Algumas notas…. não sei se elas seriam, de fato, aquelas… O problema é que o surf de competição, com a precoce e eminente aposentadoria de Mick, deixará o circuito órfão de algo muito importante para o tour: um grande surfista australiano… Vejam como as coisas são… Julien, embora eu o ache excelente, angariou muita antipatia nos últimos anos, justamente porque ganhou certos campeonatos que não se justificariam sequer num papo de bar entre bêbados… O azedume é intenso… Os jovens australianos, por sua vez, parecem muito longe da qualidade dos meninos do Brasil… Tal qual os irmãos da América, está difícil para os filhos pródigos de Mike Peterson aceitarem que a vanguarda se encontra no continente sul-americano… Entretanto, mas difícil é aceitar que os surfistas, cuja língua pátria é a mesma de Shakespeare, não fazem justiça à tradição… Seja ao norte, seja ao sul da linha do Equador… Talvez isso explique porque Conner Coffin é constantemente lembrado como um surfista de Rincon ou como o filho legitimo de Curren… Sejamos franco, bom surfista…. mas… Curren? Jura? A blasfêmia deveria ser punida com castigo severo…
Ao não ter cão, vamos de gato… E Matt é o exemplo de que há felinos demais em 2016… Tomara que JJ, Medina e Felipe acordem para mostrar para o mundo que força de vontade é apenas um componente para liderar o Tour… No mais, talento e caldo de galinha… Aquela bateria do líder com Guigui não sai da minha cabeça…

Ps:


Suponho que todo australiano padecerá de morte na rua enquanto não sabermos o que acontecerá com Jack Robinson ao tornar-se adulto… Minhas fichas estão no menino…